“Eu sei que sou uma pessoa medrosa, sem preparo. Mas tenho meus sentimentos.”
E foi assim que Maíra se despediu de Maurício quando este terminou o longo relacionamento de 16 anos, onde ambos viveram felicidades e angústias, juntos. O motivo pelo qual a relação foi interrompida nunca se soube. Maurício sempre foi um homem vadio, porém seu amor por Maíra era declarado.
Ela saiu de casa às 17 horas do dia 15 de março e voltou ao lar dos pais com trinta e dois anos de idade; ele ficou, afinal de contas o apartamento era posse sua.
Quando se conheceram ela tinha dezesseis e ele trinta. A diferença de idade nunca foi problema para ninguém, muito pelo contrário; os pais de Maíra sempre fizeram muito gosto pela relação, uma vez que diziam sempre que a filha deles era uma moça muito madura pela idade que tinha.
Maíra sempre foi uma moça tímida, covarde. Parou de estudar quando completou o segundo grau, mas nunca deixou de ser orgulho para seus progenitores. Começou a trabalhar quando nova na loja do Seu Elídio, com quinze anos, vendendo roupas. Aos dezoito passou a ter carteira assinada e com dezenove tornou-se gerente da butique. Nunca foi de conversar muito com os clientes, fazia seu trabalho calada, com o olhar perdido.
Maurício casou-se cedo; com vinte anos engravidou uma rapariga de vinte e três e foi obrigado pelos pais da moça a unir-se em matrimônio com ela. A união durou cinco anos mal vividos. Maurício foi embora e nunca mais deu as caras. A criança cresceu sem pai. Ele, na verdade, era um homem boêmio, não queria saber de responsabilidades e sempre viveu da herança do pai que morreu de câncer. Sua mãe nunca lhe deu muita atenção, daí o motivo dele ter saído moço de casa para viver uma vida independente.
Quando conhecer Maíra logo pensou em se aproveitar da jovialidade da moça, e acabou o fazendo. A viu, um dia, saindo do serviço e logo foi a seu encontro. Com cinco minutos de conversa ganhou a moça. Ela pensando que havia encontrado o homem dos seus sonhos, e ele louco de desejo. As palavras doces que ele lhe dirigiu nada mais foram do que a lábia de um cafajeste prestes a dar o bote. Dito e feito. Dois meses depois estavam namorando. Ela com ele, e ele com ela e mais umas cinco.
Algum tempo passou e um sentimento nasceu. Um carinho talvez. Maurício nunca foi de sentimentalismos e muito menos acreditava em amor. Já Maíra, coitada, passava horas lendo livros de romance e sonhando acordada. Seu marido significava a vida para ela. Ele a traía com tantas outras que não era possível nem enumerá-las.
Quando Maíra engravidou, porém, Maurício ficou bobo. Sabe-se lá o que aconteceu, mas o machão cedeu ao deleite da paternidade. Morria de amores cada vez que olhava para àquela barriga que crescia. Suas amantes? Foram todas deixadas de lado, viraram passado.
No aniversário de 10 anos de Aninha, a filha do casal, Maurício sumiu. Pobre Aninha. Caía em prantos cada vez que se lembrava do pai. Ele sempre foi muito amoroso com a menina.
Aninha cresceu num lar estável. O pai trabalhava das 8h às 18h todos os dias, a mãe ficava em casa cuidando da menina. A educação que lhe foi dada foi uma educação rígida, porém inundada de carinho.
Certo dia, Maíra abrira uma carta que fora endereçada a Maurício com o remetente em branco. Era sua ex-mulher. E foi assim que Maíra descobriu todo o passado do marido. A carta contava desde o dia do nascimento de Joaquim a seu último aniversário; contava ainda como o menino perguntava pelo pai e a não aceitação dele pelo padrasto.
Maurício teve uma reação agressiva quando soube que a esposa abrira tal carta. Um tapa certeiro na face de Maíra foi suficiente para demonstrar sua raiva. Ela calou-se diante de tal atitude. Maurício não se desculpou, porém ela o perdoou. O amor era tanto que ela não podia ver-se em crise com o esposo. Algum tempo após esse episódio, Maíra pediu ao marido que a apresentasse a Joaquim. Ele recusou e nunca mais tocaram no assunto.
Cinco dias após seu sumiço, Maurício telefonou à Maíra dizendo-lhe que nunca mais o procurasse. Chorando, a única coisa que ela conseguiu pronunciar foi que tinha sentimentos.  Ele desligou o telefone sem maiores explicações.
Deste dia em diante Maíra começou uma busca desenfreada pela família abandonada de seu marido.  Apesar de toda a sua covardia, ela resolveu lutar para descobrir os reais motivos de ambas as separações. Não conseguia viver abandonada e queria saber o porquê daquela mulher ter passado pelo que passou.
Idas e vindas não foram suficientes para que Maíra descobrisse o paradeiro de tal família. Um ano depois Maurício voltou para casa. Dez dias se passaram sem que nenhum dos dois pronunciasse uma palavra. Quando ele resolveu falar, foi pedindo que Maíra saísse de seu apartamento.
Mesmo morando na casa dos pais, a busca não cessou. Para Maíra, o único motivo plausível para que ela e o marido se separassem era esse – outra família.  Porém nunca mais teve notícias de Maurício. A busca por essa outra família foi deixada em segundo plano no dia em que Aninha pediu, com os olhos cheios d’água, que a mãe parasse de viver em função dos outros e passasse a existir para si mesma.
Dois anos se passaram sem que Maíra sequer pensasse em Maurício e sua outra família. Dedicou-se inteiramente a Aninha. Certo dia, porém, sentiu um arrepio. Arrepio este que fez Maíra lembrar diretamente de seus fantasmas. Joaquim e sua família. As horas foram passando e nam sentiu um arrepio. Arrepio este que fez Maueaquim jamais conseguiu se livrar.aada tirava da cabeça de Maíra o pensamento fixo em Joaquim. Como queria conhecê-lo.
Neste mesmo dia o telefone tocou forte. Maíra realmente o conheceu. E isso foi no enterro do marido. Joaquim foi preso no velório de Maurício por ter se vingado de um pai ausente. Um tiro certeiro, e marcas de um passado que Joaquim e Maíra jamais conseguirão se livrar.
quinta-feira, 14 de maio de 2009
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